sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Natal: Nosso Salvador nasceu!



1° Sermão de natal- Leão Magno, Papa
(440-464 A.D.)

Nosso Salvador, amados filhos, nasceu hoje; alegremo-nos. Não pode haver tristeza quando nasce a vida: dissipando o temor da morte, enche-nos de alegria com a promessa da eternidade. Ninguém está excluído da participação nessa felicidade; a causa da alegria é comum a todos porque nosso Senhor, aquele que destrói o pecado e a morte, não tendo encontrado nenhum homem isento de culpa, veio libertar a todos. Exulte o justo, porque se aproxima da vitória. Rejubile o pecador, porque é convidado ao perdão. Reanime-se o gentio, porque é chamado à vida.

Ao chegar a plenitude dos tempos, fixada pelos insondáveis desígnios divinos, o Filho de Deus assumiu a natureza do homem para reconciliá-lo com o seu Criador, de modo que o demônio, autor da morte, fosse vencido pela mesma natureza que ele antes vencera. Esse combate travado por nossa causa realizou-se com grande e admirável equidade: o Senhor todo poderoso lutou contra o inimigo cruel, não em sua majestade, mas em nossa humilde condição, opondo-lhe a mesma forma e a mesma natureza que a nossa, igualmente mortal, porém imune de todo pecado. Não se aplica por certo a esse nascimento o que se lê a respeito de todos os outros: Ninguém está isento de mácula, nem mesmo a criança que só tem um dia de vida na terra. 'Esse nascimento único nada deveu à concupiscência da carne, nada da condição do pecado se comunicou a ele. É escolhida uma virgem da estirpe real de Davi para trazer em seu seio essa santa descendência, a criança divina e humana que ela concebe em seu espírito antes de conceber em seu corpo. E para impedir que, ignorando o desígnio celeste, ficasse perturbada com efeitos tão insólitos, sabe por um anjo o que o Espírito Santo iria nela operar; e não teme por sua pureza aquela que seria em breve mãe do Filho de Deus. Por que, na verdade, recear essa extraordinária concepção, se recebeu a promessa de que ela se faria pelo poder do Altíssimo? Aliás sua fé é confirmada pelo testemunho de um milagre anterior: Isabel é agraciada com uma inesperada fecundidade; não se poderia desse modo duvidar de que daria à virgem o privilégio de conceber, aquele que já o dera à estéril.

Assim o Verbo de Deus, Filho de Deus e ele próprio Deus, que no princípio estava com Deus, por quem tudo foi feito e sem o qual nada foi feito, tornou-se homem para libertar da morte eterna o homem. Abaixou-se até revestir a nossa humilde condição, sem prejuízo de sua majestade; permanecendo o que era e assumindo o que não era, uniu verdadeiramente a forma de servo àquela forma em que é igual ao Pai e ligou tão estreitamente as duas naturezas que a glorificação não consumiu a inferior, nem a condescendência diminuiu a superior. Permanecendo, pois incólumes as propriedades de cada natureza na unidade de uma só pessoa, a humildade é assumida pela majestade, a fraqueza pela força, a condição mortal pela eternidade; e para solver a dívida de nossa condição humana, a natureza inviolável une-se a uma natureza passível e o Deus verdadeiro e o homem verdadeiro se associam na unidade do Senhor. Desse modo, como era necessário para nosso remédio, o único e mesmo mediador entre Deus e os homens poderia, de uma parte, morrer e da outra, ressuscitar.

Esse nascimento, amados filhos, convinha a Cristo, poder e sabedoria de Deus; por meio dele uniu-se a nós pela humanidade, continuando a nos ser superior pela divindade. Se ele não fosse verdadeiro Deus, não nos teria trazido socorro; se não fosse verdadeiro homem, não nos teria dado seu exemplo. Eis por que, ao nascimento do Senhor, os anjos, exultantes de alegria, cantam: Glória a Deus nas alturas e anunciam: Paz na terra aos homens de boa vontade. Eles vêem a Jerusalém celeste ser formada de todas as nações do mundo; por essa obra inexprimível do amor divino, como não devem se alegrar os homens, em sua pequenez, quando os anjos, com sua grandeza, assim se rejubilam?

Amados filhos: demos graças a Deus Pai, por seu Filho, no Espírito Santo; pois, na imensa misericórdia com que nos amou, compadeceu-se de nós; e como estávamos mortos por nossos pecados, fez-nos reviver com o Cristo para que fôssemos nele uma nova criação, nova obra de suas mãos. Despojemo-nos portanto do velho homem com seus atos; e tendo sido admitidos a participar do nascimento de Cristo, renunciemos às obras da carne. Toma consciência, ó cristão, de tua dignidade, e já que participaste da natureza divina não voltes aos erros de antes por um comportamento indigno de tua condição. Lembra-te de que cabeça e de que corpo és membro. Recorda-te de que foste arrebatado do poder das trevas e levado para a luz e o reino de Deus. Pelo sacramento do batismo te tornaste o templo do Espírito Santo. Não expulses com má ação tão grande hóspede, não recaias sob o jugo do demônio, porque o preço de tua salvação é o sangue de Cristo. Julgar-te-á segundo sua verdade aquele que te redimiu em sua misericórdia e reina, com o Pai e o Espírito Santo, pelos séculos dos séculos. Amém.

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